No livro A New World Order (2004), publicado pela Princeton University Press, a professora Anne-Marie Slaughter propõe uma nova forma de entender a governança global. Em vez de focar apenas na soberania dos Estados como atores principais nas relações internacionais, Slaughter sugere que a chave para enfrentar os desafios globais contemporâneos está nas redes de governança formadas entre diferentes instituições governamentais ao redor do mundo. A autora apresenta uma visão transformadora, onde juízes, reguladores, policiais e outros agentes estatais de diferentes países interagem diretamente, sem depender exclusivamente das estruturas tradicionais do Estado-nação.
A teoria central do livro é a de um “estado desagregado”, onde os países não funcionam mais como entidades unificadas e autossuficientes, mas como redes compostas por diferentes componentes governamentais que se conectam globalmente. Slaughter explora como essas redes transnacionais estão substituindo, ou pelo menos complementando, as formas tradicionais de diplomacia, comércio e até mesmo resolução de disputas internacionais. Nesse modelo, a governança se dá através da interação horizontal entre diferentes órgãos de governo, como agências reguladoras, tribunais e parlamentos, e da coordenação vertical com organismos supranacionais.
Um exemplo claro de como essas redes operam é a cooperação entre reguladores financeiros de diversos países. Slaughter descreve como os ministros da Fazenda e bancos centrais trabalham em conjunto para lidar com crises financeiras e promover a estabilidade global. Outro exemplo é o papel das redes judiciais, onde juízes de diferentes países começam a consultar decisões de tribunais internacionais ou regionais para melhorar a interpretação e aplicação das leis. A autora destaca, ainda, como os tribunais nacionais e supranacionais estão cada vez mais interconectados, criando uma rede global de aplicação das leis.
Entretanto, Slaughter também reconhece as limitações e desafios dessa nova ordem mundial. Apesar de as redes de governança serem mais flexíveis e ágeis do que as instituições tradicionais, como a ONU ou o FMI, elas enfrentam dificuldades em termos de accountability e de garantir que todos os países, especialmente os mais fracos, tenham voz ativa nesse sistema. Além disso, há a questão da transparência e da acessibilidade dos processos decisórios, o que pode resultar em uma forma de governança elitista e desconectada das populações locais.
Slaughter argumenta que, para que essa nova governança seja verdadeiramente eficaz e justa, é necessário estabelecer normas globais que regulem essas redes de maneira transparente e democrática. Ela propõe que a criação de uma “nova ordem mundial” deve ser baseada em cinco princípios: igualdade deliberativa global, diferença legítima, comitê positivo, separação de poderes e subsidiariedade. Estes princípios visam garantir que, apesar da diversidade das instituições nacionais, todos os países possam participar da construção de um sistema de governança global mais inclusivo e colaborativo.
O conceito de governança por redes apresentado pela autora tem implicações significativas para a teoria política e a prática internacional. Ao substituir a visão de um mundo governado por Estados soberanos com uma rede de instituições interconectadas, a autora sugere que a cooperação global pode ser mais eficaz e menos centralizadora. Em vez de uma única instituição internacional controlando o sistema, são as interações entre as diversas agências governamentais que ajudam a moldar as políticas globais.
Essa abordagem oferece uma visão mais dinâmica e interligada do sistema internacional, mas também levanta questões sobre sua viabilidade prática e os possíveis impactos sobre a soberania dos Estados. Slaughter propõe um modelo de governança descentralizado, onde as decisões ainda são tomadas em nível nacional, mas com uma coordenação mais estreita e cooperativa entre os governos.
Por fim, A New World Order desafia os leitores a repensar a estrutura da política internacional e o papel dos Estados em um mundo cada vez mais interconectado. A proposta de Slaughter, embora inovadora e provocadora, exige uma reconsideração das tradições de soberania e das práticas de governança, apontando para um futuro em que as redes de governança possam complementar e, em alguns casos, substituir as instituições tradicionais. O livro é uma contribuição fundamental para os debates sobre governança global no século XXI, oferecendo uma reflexão profunda sobre como as políticas internacionais podem evoluir para enfrentar os desafios contemporâneos. O livro está disponível no site da Amazon, com preço de R$ 341,10 (link).