“TRIBUTAÇÃO É ASSUNTO DE JURISTA.”
Essa crença está bastante cristalizada no Brasil. É como se a tributação tivesse origem em leis, acórdãos e normas constitucionais. Outros profissionais até podem lidar com a tributação, mas apenas aplicando aquilo que os juristas conceberam .
A possibilidade de se pensar e discutir tributação parece impossível fora do território jurídico. Esse privilégio é reservado aos poucos que dominam os jargões e sabem decifrar os tecnicismos.
Essa situação possui três causas .
Em primeiro lugar, o reducionismo jurídico. A tributação é vista apenas como um conjunto de regras, e o papel do tributarista se limita ao de analista ou comentador. Essa visão abstrata reforça a ideia de que a tributação surge da norma, causando uma profunda desconexão do tributarista com a realidade social.
Em segundo lugar, o isolacionismo jurídico. Entre os juristas brasileiros, é comum não ter outros referenciais além dos nacionais. Ignora-se todo um rico universo de experiências e culturas jurídicas das quais é possível aprender algo. Isso empobrece o debate tributário e impede a criatividade jurídica.
Em terceiro lugar, a prevalência do positivismo jurídico . Essa hegemonia traz consigo uma série de atitudes limitantes. Isso é problemático quando tratamos de um fenômeno tão peculiar quanto a tributação — que, por sua complexidade social e histórica, merece um tratamento à altura.
E se a prática tributária é assim, o mesmo acontece com o ensino.
Os grandes centros dedicados à tributação no Brasil são dominados por acadêmicos e juristas, sobretudo advogados, que foram formados nesses termos. Assim, esses centros não produzem conhecimento sobre o fenômeno tributário, mas acabam reproduzindo uma determinada mentalidade que está profundamente enraizada em nossa cultura jurídica.
Isso afeta a qualidade da formação dos profissionais que atuam com tributação. Incentivados a aderir a uma visão tributária reforçada há décadas, eles não conseguem ter um entendimento profundo de muitas questões historicamente centrais para o debate tributário . Assim, não conseguem realizar um trabalho mais assertivo e de maior impacto .
A tributação é um assunto importante demais para ser exclusiva de juristas. Foi essa certeza que fez nascer a Escola Superior de Tributação de Brasília.
Nossa missão é resgatar a tributação desse confinamento que já dura tanto tempo. Para isso, são necessárias três atitudes.
Primeiro, uma atitude realista. A tributação é um fenômeno multifacetado que possui um aspecto normativo importante, mas que não se limita a ele. É preciso reconhecer a existência de um campo tributário — um território formado pela interação entre atores diversos, onde práticas discursivas e relações de poder são construídas. E um componente importante dessa atitude realista é a contribuição que o funcionalismo público pode oferecer sobre a tributação.
Segundo, uma atitude plural. Reduzir a tributação a seus aspectos normativos impede a compreensão desse fenômeno com profundidade. Por isso, é fundamental integrar outros campos do conhecimento ao estudo tributário — como História, Economia, Contabilidade, Sociologia, Relações Internacionais e Ciência Política.
Terceiro, uma atitude criativa. A mera repetição de categorias intelectuais já cristalizadas produz raciocínios tautológicos — o contrário do que se espera de uma atividade intelectual autêntica. É preciso pôr à prova os axiomas do discurso tributário brasileiro, a partir de uma análise honesta e corajosa, para construir novas categorias intelectuais mais próximas da realidade social .
O que buscamos com a adoção dessas atitudes é formar os melhores profissionais do campo tributário com um ensino de excelência, multidisciplinar e com vocação internacional. Desejamos que tenham uma percepção mais ampla e profunda sobre o fenômeno tributário e, dessa forma, façam um trabalho de maior pertinência e valor para o mercado, o Estado e a sociedade.
Mas nós queremos mais do que formar profissionais de ponta.
Queremos desenvolver um discurso tributário mais dinâmico e realista trazendo um olhar diferente, inspirado por outras tradições jurídicas.
Queremos desenvolver um pensamento tributário que, tendo profunda conexão com a nossa realidade social, consiga dialogar com outras culturas tributárias pelo mundo.
Queremos concretizar a vocação do Brasil como ator de grande relevância nos debates tributários internacionais.
O campo tributário brasileiro está às portas de uma grande transformação. Vamos juntos?